Uma das melhores maneiras de trazer os pássaros para perto de nós é plantando árvores. As árvores fornecem alimento, sombra e proteção, sendo essenciais para a sobrevivência das aves em meio à selva urbana. Não tem espaço para uma árvore em sua casa? Plantas menores também ajudam, e você pode colocar vasos na sacada do apartamento e encher o peitoril da janela de flores!
Espécies de plantas nativas (ou seja, que ocorrem naturalmente na região) são sempre a melhor opção. Plantas nativas estão extremamente adaptadas às condições de luz, umidade e solo locais, além de manter relações ecológicas com a fauna nativa que já perduram por milhares de anos. Lamentavelmente, pode ser difícil encontrar uma boa variedade de mudas nativas nas floriculturas. Isso porque o paisagismo tradicional dá preferência para plantas exóticas, originárias de outros países. De fato, apesar de vivermos em um dos países mais biodiversos do planeta, nossos jardins e praças são pobres, sempre com as mesmas plantas, quase sempre exóticas…
Felizmente, de uns tempos para cá muita gente tem questionado os jardins tradicionais e já temos uma nova geração de paisagistas preocupados em utilizar plantas nativas em suas composições. Os passarinhos agradecem! Mas você já parou para pensar por que algumas plantas atraem mais aves que outras?
Interações animais-plantas
Existem vários tipos de interações entre animais e plantas, mas no momento estamos mais interessados em relações mutualistas, que são aquelas em que ambos saem ganhando. Muitas plantas contam com a “ajuda” dos animais para realizar duas tarefas muito importantes: polinizar suas flores e dispersar suas sementes. A palavra “ajuda” está entre aspas porque os animais não fazem isso de graça e muito menos propositalmente. Eles são “subornados” com alimento, seja na forma de néctar doce, seja na de frutos carnosos e nutritivos.


Insetos, aves, mamíferos… Vários animais podem ser recompensados pelas plantas para realizar as tarefas de polinizar flores ou dispersar sementes. Mas, ao longo do processo evolutivo, muitas plantas acabaram se especializando em um único grupo animal, criando flores e/ou frutos que atraem mais um grupo do que outro.
Ornitocoria (síndrome de dispersão de sementes por aves)
As plantas que atraem aves para disseminar suas sementes produzem frutos ornitocóricos. Esses frutos costumam apresentar as seguintes características (que podem ou não estar todas presentes, por isso dizemos que é uma “síndrome”):
- Cores atrativas quando maduros;
- Verdes ou ácidos quando imaturos (ou seja, quando as sementes ainda não estão prontas para serem disseminadas);
- Sementes resistentes ao processo de digestão das aves;
- Ausência de cheiro (a maioria das aves não tem o olfato muito apurado);
- Ausência de casca rígida;
- Localização exposta e conspícua na planta.

Mesmo frutinhos pequenos e sem graça, que não servem de alimento para nós, podem ser uma fartura para as aves! Frutos ornitocóricos atraem sanhaços, saíras, sabiás, periquitos, jacus e uma infinidade de aves que se alimentam preferencialmente de frutos.

Alguns exemplos de plantas que são muito utilizadas em jardins e parques para atrair aves são: fruta-de-sabiá, guabiroba, guaçatonga, grumixama, araçá, pitanga, acerola, jabuticaba, pau-de-viola, ingá, canela-amarela, aroeira e diversos tipos de palmeiras. Clique aqui para acessar uma galeria de fotos de plantas que atraem aves.
Ornitofilia (síndrome de polinização por aves)
Plantas que atraem aves para realizar a troca de pólen produzem flores ornitófilas. Aqui no Brasil e em toda a região neotropical (que compreende a América do Sul, América Central, parte do México e dos EUA) os beija-flores constituem o principal grupo de aves especializado em se alimentar de néctar. Por isso, as flores ornitófilas daqui apresentam um conjunto de características que atraem prioritariamente beija-flores. Nos outros continentes não existem beija-flores, portanto as flores ornitófilas de lá apresentam outras características, que atraem diferentes grupos de aves.
Flores polinizadas por beija-flores costumam apresentar as seguintes características:
- Cores brilhantes, sendo que as vermelhas são as preferidas dos beija-flores;
- Néctar em abundância escondido na base da flor;
- Flores tubulares (adaptadas aos bicos longos dos beija-flores);
- Flores reunidas em inflorescência;
- Flores abertas e aptas a serem polinizadas durante o dia (pois os beija-flores são aves diurnas);
- Ausência de cheiro (a maioria das aves não tem o olfato muito apurado);
- Ausência de poleiros perto da flor (pois os beija-flores são capazes de voo pairado).

Existem outras aves que também se alimentam de néctar e podem ser atraídas por essas flores: sanhaços, saíras, cambacicas… Nem sempre essas aves são boas polinizadoras, pois algumas “burlam” o sistema e furam a base das pétalas para obter o néctar, sem se sujar de pólen. Outras são ainda mais oportunistas e consomem também as pétalas das flores, como fazem alguns periquitos.

Existe uma infinidade de flores que podem ser utilizadas em jardins e parques para atrair aves. Alguns exemplos: lantana, flor-de-maio, caliandra-vermelha, brinco-de-princesa, cipó-de-são-joão, jacarandá, ipê, ingá, paineira, mulungu. Clique aqui para acessar uma galeria de fotos de plantas que atraem aves.
Como escolher plantas?
Cada vegetal possui características próprias, com diferentes necessidades de luz, adubação e rega. Por isso, o primeiro passo é avaliar o local onde você pretende manter suas plantas. Bate sol direto? Quantas horas por dia? Vai plantar direto no chão ou em um vaso? Quais são o tipo e a profundidade do solo? Essas informações são cruciais para saber quais plantas, e de qual porte, podem viver bem ali.
O Brasil é um país tão grande que é difícil indicar plantas nativas para o plantio, pois o que é nativo em uma região pode não ser nativo de outra região. Algumas prefeituras fornecem listas das árvores mais indicadas para a arborização urbana. Vale a pena pesquisar um pouco e conversar com alguém que entenda do assunto, como o pessoal que trabalha nas floriculturas.
Se por algum motivo você optar por uma planta exótica (ou seja, que não é nativa da região), verifique antes se a planta não é considerada uma espécie invasora. A uva-japonesa, por exemplo, é extremamente apreciada pelos passarinhos. Mas eles dispersam tão bem suas sementes que essa árvore, que é de crescimento rápido, está invadindo nossas matas nativas. Outros exemplos de plantas que são exóticas invasoras, mas infelizmente ainda são muito utilizadas no paisagismo: cheflera, espatódea, leucena, maria-sem-vergonha, nêspera, tumbérgia-azul, ipê-de-jardim e muitas outras.
Árvores na calçada? Sim, quanto mais melhor! Ruas arborizadas funcionam como corredores verdes, conectando parques e praças e permitindo que os animais se locomovam melhor pela cidade. Mas antes de escolher uma muda, consulte a prefeitura de sua cidade. Existem algumas orientações (que podem mudar um pouco de município para município) que levam em consideração a largura da calçada, a existência de rede elétrica, placas de sinalização, bocas de lobo e outros equipamentos urbanos. Para saber mais sobre o assunto, dê uma olhada no Manual Técnico de Arborização Urbana de Salvador com espécies nativas da Mata Atlântica ou no Manual técnico de arborização urbana da cidade de São Paulo.
Bibliografia consultada
Cardim, R. (2022) Paisagismo sustentável para o Brasil: Integrando natureza e humanidade no século XXI. Editora Olhares, 304 p.
Secretaria do Meio Ambiente e Infraestutura do Rio Grande do Sul (2020) Recomendação CONSEMA 007/2020. Recomenda a necessidade da substituição da espécie Hovenia dulcis (uva-do-japão) nos estabelecimentos de avicultura e de suinocultura no Estado do Rio Grande do Sul.
Lacerda, L. (2022) Jardim de Polinizadores. Blucher, 104 p.
Palazzo, J. T. Jr (2021) A natureza no jardim: Um guia para a criação de refúgios de vida em nossas próprias casas. 5a. edição. Clube dos Autores, 225 p.
Prefeitura Municipal de Salvador (2017) Manual técnico de arborização urbana de Salvador com espécies nativas da Mata Atlântica. 166 p.
Rodrigues, M. (2018) O equinócio dos sabiás: aventura científica no seu jardim tropical. Editora UFPR, 176 p.
Sanchotene, M. C. C. (1989) Frutíferas nativas úteis à fauna na arborização urbana. Sagra, 306 p.
Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo (2015) Manual técnico de arborização urbana. 3a. edição, 121 p.
Spotswood, E. N. et al (2021) The biological deserts fallacy: cities in their landscapes contribute more than we think to regional biodiversity. BioScience, v. 71, n 2, p. 148-160
Van der Pijl, L. (1972) Principles of dispersal in higher plants. Spring-Verlag, 162 p.