A Trilha Inca é um trekking clássico, que permite chegar a Machu Picchu através do antigo caminho criado pelos incas em meio as montanhas. São 44km muito íngremes, grande parte na forma de degraus e mais degraus de pedra. O visual é fantástico, e muda muito conforme a altitude. De cactos à florestas tropicais. Mas não é uma trilha fácil. Mesmo andando num ritmo tranquilo, nos pontos mais altos o ar rarefeito causa muito cansaço. Afinal, alcançamos mais de 4.000 metros! Apesar de todas essas adversidades, não é fácil conseguir uma vaga. São permitidas apenas 500 pessoas por dia na trilha, e, como a procura é grande, é preciso fazer uma reserva com pelo menos três meses de antecedência.
Minha maior motivação para participar dessa maluquice foi a oportunidade única de observar as aves da região. A trilha encontra-se dentro de um parque nacional, bem preservado e pouco povoado, com uma diversidade enorme de fauna e flora. Só não é perfeito para birdwatching por causa da enorme quantidade de pessoas fazendo a trilha, o que acaba afugentando muitos animais e atrapalhando várias oportunidades de fotografar. Mesmo assim, pude aproveitar bastante e conhecer um pouco da avifauna peruana. O primeiro da lista foi, nada mais nada menos que o maior beija-flor do mundo (pelo menos é o que dizem aqui), o picaflor-gigante!
Aliás, beija-flores não faltam na trilha. De todos os tamanhos e de todas as cores, nunca tinha visto tanta variedade em um lugar só! E absolutamente nenhuma espécie que eu já conhecesse, foi estranho não ver um beija-flor-tesoura ou um besourinho-de-bico-vermelho entre eles. Mas não faltaram aves super conhecidas por nós brasileiros. Os tico-ticos, por exemplo, eram presença constante. Pude observá-los até nas maiores altitudes, mesmo com muito frio e chuva. A única diferença é que lá seu canto é diferente, um pouco mais rápido. Também vi o simpático papa-lagarta-acanelado (Coccyzus melacoryphus), que por lá é um visitante migratório. Outro nosso bem conhecido é o quiriquiri (Falco sparverius).
Outra ave bem comum ao longo da trilha é o zorzal-grande, o sabiá local. Enquanto nas cidades o zorzal-chiguanco (Turdus chiguanco) predomina, nas montanhas ele é substituído pelo zorzal-grande. Dá pra ver de longe o laranja do bico e das patas.
Um pontinho azul chamou minha atenção, movimentando-se rápido entre os arbustos. Era um azulito-altoandino. Outras observações rápidas foram o tangara-pizarrosa (Creurgops dentatus), cucarachero-montañes (Troglodytes solstitialis), tangara-azul-y-negra (Tangara vassorii), saltador-de-pico-dorado (Saltator aurantiirostris), além de enormes bandos de cotorra-mitrata (Aratinga mitrata), lindas lindas!
No último dia, depois de atravessar a Porta do Sol (já a poucos passos de Machu Picchu) aparece esta Elaenia, de brinde. Pena que não vocalizou! Essas aves sempre são difíceis de identificar. Já em Machu Picchu, com tanta gente percorrendo as ruínas, só deu para observar tico-ticos e andorinhas.
O passeio valeu muito a pena e super recomendo. Além da paisagem e dos bichos (além das aves, consegui ver muitas lhamas e até um veado), ainda dá pra explorar várias ruínas que estão espalhadas pelo caminho. Como fui em Novembro, peguei um pouco de chuva, o que atrapalhou um bocado. Várias vezes deixei de fotografar por medo de tirar a câmera da mochila…
Só não curti o esquema como o passeio é organizado. Não é permitido fazer a trilha sem um guia, e até aí eu entendo e apoio completamente. Mas além do guia, as agências contratam também carregadores, que levam barracas, comida e uma variedade de badulaques, um exagero. Embora esta seja uma alternativa de renda para as populações locais, acredito que poderia ser encontrada uma opção menos desumana. Os caras carregam muito peso, mas muito mesmo! E não rola nenhuma integração entre eles e os visitantes, até mesmo pelas barreiras impostas pelo idioma, o que é muito triste.