Antigamente não havia araras em Campo Grande (MS). Provavelmente elas estavam por lá antes da fundação da cidade em 1872, mas depois desapareceram. Porém, em 1999, araras-canindés e araras-vermelhas começaram a ser avistadas na área urbana. Acredita-se que chegaram lá em busca de alimento e locais de nidificação, pois o entorno havia sofrido um longo período de seca, queimadas e desmatamentos. Campo Grande é uma cidade bastante arborizada, com muitas palmeiras ornamentais, o que parece ter ajudado na adaptação destas aves (em especial as araras-canindés) ao ambiente urbano. Desde então as araras se estabeleceram, sua população cresceu e hoje elas são muito fáceis de observar por lá. Não é à toa que em 2021 a cidade foi reconhecida formalmente como a “capital das araras”.
Mês passado estive de passagem por Campo Grande e aproveitei para conhecer o Instituto Arara Azul, que tem sede na cidade. O Instituto é muito famoso por seu trabalho excepcional na conservação da arara-azul no Pantanal, um projeto idealizado pela bióloga Neiva Guedes e desenvolvido há mais de 30 anos. O que eu não sabia é que, desde 2011, o Instituto também tem realizado estudos sobre a biologia das araras-canindés que vivem em Campo Grande, por meio do Projeto Aves Urbanas – Araras na Cidade.
Apesar da arara-canindé ocorrer em grande parte do Brasil, esta espécie havia sido pouco estudada até então. Para conhecer melhor a ave, biólogos e veterinários têm monitorado ninhos espalhados por toda a cidade. Eles já cadastraram mais de 360 ninhos. E olha que legal: se você estiver em Campo Grande durante o período reprodutivo das araras (entre Agosto e Dezembro), pode entrar em contato com o Instituto Arara Azul e agendar um passeio turístico para conhecer de perto este trabalho. É uma maneira bem bacana de contribuir com o projeto e ainda aprender muito sobre essas aves incríveis!
Era Agosto e tive a oportunidade de acompanhar o primeiro dia de monitoramento desta estação reprodutiva. Ainda era cedo para encontrar filhotes, mas a equipe registrou os primeiros ovos da temporada. Foi uma experiência muito rica: eles me mostraram como fazem para acessar os ninhos e vários pormenores do trabalho, e ainda responderam todas as minhas dúvidas e curiosidades (que não foram poucas). Também tive a sorte de observar uma arara híbrida que apareceu junto com um bando de araras-canindés durante o monitoramento.
Araras híbridas costumam resultar de cruzamentos entre a arara-canindé e a arara-vermelha, em situações de cativeiro. Mas essas híbridas têm sido observadas há alguns anos lá em Campo Grande, inclusive pareando e reproduzindo. O Projeto Aves Urbanas também monitora os ninhos destas araras híbridas, para tentar entender melhor esses casos tão incomuns.
Vai passear pela região? Não perca a oportunidade de ver as araras de Campo Grande! Se não for possível presenciar um monitoramento do Projeto Aves Urbanas, não se preocupe. A cidade oferece oportunidades de sobra para observar araras-canindés. Certamente você vai avistar algumas cruzando o céu. Mas se quiser ver algumas araras mais de perto, sugiro dar um pulo na Avenida Dr. Fadel Tajher Iunes, no começo da manhã ou no finalzinho da tarde. Como eu estava hospedada ali perto, desconfiei que aquele monte de troncos de palmeiras deveria ser atrativo para a espécie e consegui ver muitos casais de araras retornando para os ninhos no final do dia. Mas claro que devem haver outros bons lugares para ver araras na cidade (campo-grandenses por favor deixem dicas nos comentários!).
Com bastante sorte também é possível encontrar a arara-vermelha e a arara-azul na cidade (tem alguns registros no WikiAves), mas não é tarefa fácil. Conversei com vários moradores de Campo Grande e a maioria afirmou que só conhece a arara-canindé. Mas todos falam das araras com muito orgulho. Não é pra menos, né?
Saiba mais
Campo Grande das Araras – A Proteção do Instituto Arara Azul
(vídeo produzido pelo projeto Campo Grande das Araras, que mostra como é feito o monitoramento das araras-canindés, além de outras ações promovidas pelo Instituto Arara Azul)
1 Comentário
Muito interessantes teus relatos , vão ajudar muitos passarinheiros , dê um puinho em Mostardas-RS , tem muita aves na região, voltei de lá esta semana , e já pensando em retornar em outubro.
Parabéns pela dedicação e relatos.