Fernando de Noronha é um arquipélago localizado a aproximadamente 360 km de Natal (RN). Considerado um distrito estadual de Pernambuco, o arquipélago é formado por uma ilha principal (a única habitada) e 20 ilhotas e rochedos. Para proteger este rico ecossistema foi criado, em 1988, o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha. O parque abrange todas as ilhotas e cerca de dois terços da ilha principal.
Estive em Fernando de Noronha no final de Fevereiro. Fazia muito calor e a pequena Vila dos Remédios estava bastante agitada por causa de um campeonato de surf. Logo que cheguei deixei minhas coisas na pousada e corri para o centro de visitantes do ICMBio. Comprei o ingresso que permite a entrada no parque e agendei as trilhas que queria conhecer. Nem todos os atrativos do parque exigem agendamento, mas alguns pontos mais interessantes, como a famosa piscina da Atalaia, têm número de visitantes restrito para evitar maiores impactos ambientais.
Chegando em Fernando de Noronha a primeira ave que encontrei foi a garça-vaqueira. Elas estão por todos os lados. Essa espécie não é nativa do arquipélago e foi avistada lá pela primeira vez em 1986. Adaptou-se bem às condições locais e hoje há um superpopulação que ameaça o ecossistema e causa preocupação no aeroporto (dá para ver garças na grama logo ao lado da pista de pouso).
Outras duas espécies de aves muito fáceis de observar são o sebito e a cocoruta. Estes passarinhos são endêmicos, o que quer dizer que somente podem ser encontrados em Noronha e em nenhum outro lugar do planeta! Pude ver ambos logo no primeiro dia, enquanto caminhava pela área urbana em direção ao ICMBio. Foi uma alegria só pois eram um dos principais motivos da viagem.
Depois de agendar as trilhas, conversei com uma funcionária do ICMBio que me apresentou à bióloga Ariane Gouvêa. Ela trabalha no Projeto Aves de Noronha, que tem como objetivo despertar o interesse das pessoas (tanto moradores como turistas) para as aves que habitam a ilha. O projeto é recente (foi criado em 2018) mas já viabilizou palestras, cursos, saídas para observação de aves e atividades para crianças. O mini guia abaixo é distribuído gratuitamente pelo projeto e é muito lindo! Foi super útil em minhas passarinhadas pela ilha!
A maioria das aves que aparece no guia é fácil de encontrar, é só estar atento enquanto faz os passeios turísticos, percorre as trilhas ou mesmo enquanto curte o sol nas praias. Como não havia espaço para todas as fotos que tirei aqui, montei uma galeria com todas as espécies que observei durante minha estadia em Noronha. A pomba-de-bando, por lá chamada de arribaçã, foi a ave mais fácil de fotografar e que fez mais pose. Pertence à subespécie Zenaida auriculata noronha. Não é muito diferente das que vejo sempre em São Paulo, mas me pareceu um pouco mais colorida, com cores mais vibrantes.
Os atobás certamente são as aves mais notadas pelos turistas. Vi muita gente maravilhada com os mergulhos rápidos e certeiros que os atobás fazem para pescar, por vezes bem perto da praia. No chão eles perdem um pouco da graciosidade e caminham desajeitados, como os patos. Em Noronha há três espécies de atobás: o atobá-pardo, o atobá-de-pé-vermelho e o atobá-grande (vou ficar devendo foto deste último).
A grazina (ou noivinha, como é conhecida localmente) era uma espécie que eu queria muito poder observar. No Brasil esta ave só pode ser encontrada em Noronha, Abrolhos, Trindade e Martim Vaz. E não foi difícil, vi várias grazinas voando perto do mirante da baía dos golfinhos. Depois desci até a praia do Sancho (eleita a mais bela praia do mundo pelo TripAdvisor em 2019) e pude observar algumas grazinas de pertinho, enquanto descansavam empoleiradas nas árvores.
Mas a fauna de Noronha não se resume às aves. Em todo e qualquer canto você encontra um pequeno lagartinho muito serelepe, que sobe até em árvores. É a mabuia, um réptil endêmico do arquipélago. A mabuia teria poucos predadores com que se preocupar, não fossem os gatos. Estima-se que hoje existam cerca de 1.300 gatos em Noronha, muitos deles ferais (ou seja, que vivem soltos na natureza, sem depender dos humanos). Sua presa preferida é a mabuia, mas os gatos também predam ninhos de sebito, cocoruta, atobás, grazinas e rabos-de-palha-de-bico-amarelo.
Outro animal fácil de encontrar em Noronha é o mocó. Este simpático roedor é bastante dócil, permitindo que os turistas se aproximem bastante (lembrando que nunca devemos tocar ou alimentar animais silvestres). Mas é mais uma espécie que não é nativa da ilha. Não encontrei fontes confiáveis para citar, mas até onde consegui descobrir o mocó foi trazido da caatinga para a ilha propositalmente, para consumo de sua carne. Em poucas décadas sua população cresceu muito.
O mocó, o gato doméstico e o teiú são considerados espécies invasoras em Noronha e pesquisadores do Tríade (Instituto Brasileiro para Medicina da Conservaçao) estudam meios de controlar suas populações.
Como dá para perceber, Noronha é um lugar que atrai muitos pesquisadores. Além dos projetos de pesquisa sobre avifauna e controle de espécies invasoras, há também muitos biólogos e veterinários estudando a vida marinha. Os golfinhos rotadores são famosos habitantes das águas de Noronha, mas o arquipélago também é lar de inúmeras espécies de crustáceos, peixes, raias, tubarões e tartarugas marinhas. O Projeto TAMAR tem uma base lá, logo ao lado do ICMBio, com muitas atividades abertas aos visitantes. Todas as noites é oferecida uma palestra sobre assuntos diversos e duas vezes por semana os turistas são convidados a acompanhar uma captura científica de tartarugas marinhas. Pude ver uma dessas capturas na baía do Sueste e foi muito emocionante. Em poucos minutos a tartaruga (que pode ser uma tartaruga-verde ou uma tartaruga-de-pente, as duas espécies vivem nas águas da região) é retirada da água, medida, pesada e marcada com uma anilha, caso ainda não tiver uma. Esta metodologia de pesquisa é realizada desde 1987 e graças a este trabalho hoje há um grande conjunto de dados sobre a biologia destas tartarugas.
Por falar na baía do Sueste, esta foi uma das praias que mais gostei. Além da oportunidade de acompanhar uma captura científica do TAMAR, também fiz snorkel e pude observar tartarugas marinhas e pequenos tubarões em seu ambiente natural. No final da tarde, depois que a praia foi fechada (algumas atrações do parque têm horários restritos), fiquei aguardando o ônibus no ponto de informações do ICMBio. De lá deu para ver um bando de batuíras e vira-pedras que aproveitaram que a praia estava tranquila para fazer uma última refeição antes do anoitecer.
Pertinho da baía do Sueste está o açude do Xaréu, um ótimo lugar para observar aves migratórias e outras que chegam à ilha por acaso. Uma garça-moura-européia havia sido avistada recentemente, então fui ao açude todas as vezes que pude na esperança de encontrá-la. Não consegui, mas vi maçaricos-de-bico-torto, batuiruçu-de-axila-preta e várias garças-caranguejeiras. Esta garça é nativa da África, Europa e parte da Ásia, mas tem sido registrada frequentemente em Fernando de Noronha.
De fato, Fernando de Noronha é um dos lugares com maior diversidade de aves marinhas de todo o país. Infelizmente, é preciso ressaltar que a ilha principal tem apenas 17km2 e aproximadamente 2.600 moradores. Mesmo com grande parte desta área protegida pelo parque marinho (reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Natural da Humanidade), o ecossistema de Noronha é extremamente frágil e vêm sofrendo muitos impactos ambientais.
2 Comentários
Que maravilha de postagem Natália! Suas fotos ficaram lindas! Parabéns pela iniciativa, foi um grande prazer conhecê-la!!! Adoro o seu blog!
Super bjo!
Eu que agradeço por todas as dicas de passarinhadas, Ariane. Sou super fã do projeto Aves de Noronha! :)