O Parque Nacional das Emas foi criado em 1961 e protege 132 mil hectares de Cerrado, sendo que a maior parte de sua área é ocupada por vegetação baixa e mais aberta, os chamados campos limpos e campos sujos. Esse é o habitat ideal para as emas, que são abundantes por lá e emprestam seu nome à unidade de conservação.
Em 2001 o PARNA das Emas foi declarado Patrimônio Mundial Natural pela Unesco. E não é para menos: o parque é um oásis de vida isolado por um imenso mar de lavouras. Lá ainda é possível encontrar onças, tamanduás, tatus, lobos-guarás, veados e muitas espécies de aves ameaçadas de extinção, como o galito, o bacurau-de-rabo-branco e a cordona-mineira.
Estivemos lá no começo de Agosto, período seco em que praticamente não chove na região. Mas os preparativos para a viagem começaram muito antes, pois não é nada fácil obter informações sobre este parque nacional. Em Julho os sites oficiais estavam claramente desatualizados ou mesmo fora do ar. Nenhum telefone funcionava. Graças a alguns relatos antigos em blogs de viajantes, soube que devido à sua grande dimensão este parque costuma ser visitado de carro, como se faz nos safáris na África (o PARNA das Emas já fez parte até mesmo de roteiro do Rally dos Sertões). Também descobri que há uma opção de trilha autoguiada, mas não fazia a menor ideia se ela ainda estava aberta, qual seria o horário de visitação, a extensão da trilha e se ela seria feita a pé ou de carro.
A cidade mais próxima do parque é Chapadão do Céu (GO). De lá são mais uns 25 km de estrada de terra até a portaria Guarda do Bandeira, que fica na parte sul do parque. Também existe um acesso na parte norte, a portaria do Jacuba, que fica a 88 km asfaltados da cidade de Mineiros (GO). Preferimos acessar o parque a partir de Chapadão do Céu e entramos em contato com a associação de guias da cidade. Depois de muita troca de mensagem encontramos um guia que tinha disponibilidade para a data em que visitaríamos o parque. Parecia que estava tudo certo, mas uns dois dias antes do passeio o guia entrou em contato porque queria alterar o roteiro que havíamos escolhido e nos guiar somente pela manhã. Pegou a gente totalmente de surpresa e foi uma situação bem chata, mas por sorte conseguimos outra pessoa para nos guiar durante o dia todo.
Chegamos em Chapadão do Céu (GO) numa sexta-feira. Depois do almoço seguimos para a portaria Guarda do Bandeira, na esperança de fazer a trilha autoguiada, mas até então sem maiores informações. Deu certo. Fomos recebidos por um funcionário que indicou o caminho: poderíamos percorrer de carro mais ou menos 8 km até o rio Formoso e então retornar por outra estrada que faz um percurso um pouco mais longo de volta à mesma portaria.
O sol estava alto e fazia muito calor, mas mesmo assim conseguimos aproveitar bastante. Ao longo da estrada paramos para observar o belo voo das araras-canindé, o gavião-caboclo, um bando enorme de pica-paus-brancos, uma coruja que fez seu ninho dentro de um grande cupinzeiro, veados-campeiros e, tchan-tchan-tchan-tchaaaan: uma onça-parda! Sim! O encontro durou só uns 10 segundos, que foi o tempo entre ela perceber que estava sendo observada e cair fora sutilmente, mas pra mim durou uma eternidade.
Foto da onça? Nem deu tempo de pensar na câmera. Mas deu para fazer muitas fotos de aves ao redor de um pequeno conjunto de casas que fica antes da ponte sobre o rio Formoso. Ali há algumas árvores e sombra fresca.
O sol se pôs no caminho de volta e ainda tivemos a chance de observar, sob a luz do farol, um cachorro-do-mato atravessando a estrada. Emas? Só no dia seguinte.
No sábado pela manhã nossa guia nos encontrou em Chapadão do Céu e seguimos novamente para a portaria Guarda do Bandeira. Pela manhã percorremos uma longa estrada que leva até um bonito ponto de observação do rio Formoso. Se não me engano é ali que termina o passeio de boia cross, uma das atrações turísticas do parque. Paramos aqui e ali para fotografar mais araras-canindé (elas são muito fotogênicas!), papagaio-galego, gralha-do-campo, gavião-tesoura e vimos um bando de queixadas atravessando a estrada.
De lá seguimos para a parte central do parque, onde fica uma torre de observação chamada Mirante do Avoador. Assim falando parece pouca coisa, mas foram quilômetros e mais quilômetros rodados. Fizemos mais de 100 km dentro do parque só neste dia. A vista lá do mirante dá uma ideia da imensidão da paisagem e de como a região é plana. Hoje dá para monitorar áreas como essa com drones, mas imagino que esta torre já teve importância na prevenção de incêndios, que infelizmente são frequentes. Em 2021 o fogo atingiu quase 28 mil hectares do Parque das Emas.
Seguimos para a parte norte do parque, em direção à portaria do Jacuba. No caminho finalmente avistamos emas, algumas solitárias e outras (aparentemente mais jovens) em pequenos bandos. Apesar de relativamente abundantes, é preciso atenção para localizá-las em meio ao capim nativo, entre os cupinzeiros. Aliás, o que não falta neste parque são cupinzeiros! Eles são uma grande atração durante os meses de Outubro e Novembro, quando é possível observar o fenômeno da bioluminescência. Nesse período do ano, larvas de vagalumes se instalam nos cupinzeiros e emitem uma luz esverdeada durante a noite, atraindo insetos que vão servir de alimento. Uma pena que não é possível observar este fenômeno em Agosto, mas é uma boa desculpa para voltar ao parque!
Na região norte do parque também tivemos a oportunidade de observar vários grupinhos de veados-campeiros. Eles são tranquilos e dá para observá-los bem, mesmo de dentro do carro. Me senti num verdadeiro safári. Dica: baixe o Guia Ilustrado dos Cervídeos do Brasil para ajudar na identificação. Dizem que o cervo-do-pantanal também pode ser avistado no PARNA das Emas, mas essa espécie não tive a sorte de encontrar por lá.
Depois do almoço, que foi num pequeno restaurante na estrada que leva para a cidade de Mineiros, voltamos pro parque e seguimos por uma estradinha mais fechada. Chegamos em uma área com vegetação mais alta e, quem diria, um pouco de sombra. A ideia era seguir a pé pela trilha do Homem Seco, mas logo avistamos um bando enorme de queixadas (mais de 50 indivíduos) e por segurança continuamos dentro do carro.
Passamos o resto da tarde voltando lentamente para a portaria Guarda do Bandeira, curtindo o entardecer. Deu tempo de encontrar alguns galitos na região dominada pelos cupinzeiros, também conhecida como “cidade dos cupinzeiros”. O galito é um passarinho que precisa de seu habitat natural para sobreviver, pois não se adapta onde há interferência humana. Sua área de ocorrência diminuiu muito com a destruição do Cerrado e a espécie é considerada ameaçada de extinção. Foi um grande privilégio poder ver esta pequena ave!
A imensidão deste parque e a capacidade de resiliência de sua fauna e flora vão ficar para sempre na minha memória. Tenho certeza de que se mais brasileiros tivessem a oportunidade de vivenciar o Cerrado assim este bioma seria preservado com todo o afinco. Tomara que no futuro a visitação ao Parque Nacional das Emas seja facilitada. Foi triste conversar com moradores de Chapadão do Céu que nunca estiveram no parque… A gente quase desistiu de conhecê-lo por conta da falta de informações. Ainda bem que insistimos, porque foi uma experiência única!
4 Comentários
Obrigada por compartilhar!!!
Vc conhece alguma agência de ecoturismo local que tem guias p/ percorrer as trilhas com os visitantes?
Eu ia sugerir a associação de guias local, mas descobri que o site deles está fora do ar. Desculpe, não sei se existe outro jeito de entrar em contato com eles…
Ótimos relatos! Realmente esse é um Parque com pouquíssimas informações na internet. Quanto a hospedagem, você tem alguma dica?
Olá Guilherme, nós ficamos no Hotel Pousada das Emas. É pequeno e bem simples, mas fomos bem atendidos. Fiz a reserva por telefone.