Depois de uma breve estadia no refúgio Las Torres, seguimos por uma trilha de cerca de duas horas até o Acampamento Chileno. No dia anterior o céu havia fechado um pouco e ventava muito, mas agora a situação era bem pior. O vento estava muito forte, literalmente arrastando as pessoas na trilha. Muitas se agachavam e esperavam a força do vento diminuir ainda que pouco para continuar. Não chovia muito, mas as gotas eram carregadas com tanta força pelo vento que machucavam o rosto.
Minha jaqueta era a prova d’água, mas a calça não. Ficou encharcada. Nunca senti tanto frio. A trilha por si própria não era difícil, mas sofri bastante para terminá-la. Quando vi o refúgio, uma casinha cravada no vale lá ao longe, parecia uma miragem. Como foi bom chegar em um lugar quente e seco!
Depois de me secar e trocar de roupa, meu humor melhorou. Nossa ideia era fazer a trilha que leva até a base das três torres naquele mesmo dia, mas foi impossível. O tempo só piorou e fomos obrigados a ficar no refúgio. Ainda bem que o lugar é uma gracinha, e a comida boa. Tudo absurdamente caro, mas não posso reclamar de nada além do preço.
Os estrangeiros faziam fila para secar as roupas nas lareiras e, apesar de todos estarem chateados por causa do mau tempo, o clima era de descontração e camaradagem. Ao lado do refúgio o pessoal mais corajoso se abrigava nas barracas. Uma porção delas, montadas sobre plataformas.
Neste dia vi apenas um “cometocino patagónico” (Phrygilus patagonicus), que se arriscou a procurar comida nas redondezas.
Depois de muita ventania e chuva pesada durante a noite, o tempo melhorou um pouquinho no dia seguinte. Ainda estava nublado e chuviscava, mas deu para encarar a trilha até as tão famosas torres. Caminhamos umas duas horas e meia por um bosque lindíssimo, primeiro à margem de um rio, depois subindo a montanha em direção às torres. Tudo muito silencioso, durante todo o trajeto (tanto na ida quanto na volta) só vimos algumas andorinhas, um bando de cabecitasnegra austrais (Cardualis barbata) e um simpático zorzal patagónico (Turdus falcklandii) que fez pose e pediu pela foto.
A caminhada valeu pela beleza da trilha, mas não vimos o cenário de cartão postal que esperávamos. As torres estavam quase completamente encobertas por nuvens, tudo meio cinzento. Enfim, faz parte… Mas um dia vou ter que voltar!
Fizemos uma parada rápida no refúgio, pegamos nossas mochilas e seguimos. Como o tempo ainda estava ruim e muito imprevisível, desistimos da rota em “W” e decidimos voltar para o refúgio Las Torres. No exato momento em que coloquei a mochila nas costas vi uma ave grande que nadava no rio, contra a correnteza. Foi a melhor surpresa do dia! Uma fêmea de pato de torrente (Merganetta armata), espécie que é encontrada em rios na região andina, da Venezuela à Terra do Fogo. Observando mais um pouco vi o motivo de tanta agitação por parte dela: um filhote, que se aventurava na margem oposta!
Fiquei um tempão assistindo a cena. É incrível como um filhote com aparência tão frágil pode enfrentar aquela correnteza rápida e gelada. Na verdade eu sentia tanto frio que qualquer ser vivo que se atrevia a colocar os pés naquela água ganhava meu respeito. Como a “remolinera araucana” (Cinclodes patagonicus), que encontrei poucos metros depois.
No dia seguinte o tempo finalmente melhorou. Infelizmente era nosso último dia no parque, por isso tentamos aproveitar ao máximo. O próximo e último post dedicado a Torres del Paine será sobre a região da Laguna Amarga. Até breve!