Sabe aquela velha pergunta: por que passarinho não leva choque quando pousa em fio elétrico? Infelizmente, às vezes eles tomam choque sim. E morrem eletrocutados, além de causar vários prejuízos para as companhias responsáveis pelo fornecimento de energia. Isso acontece muito com aves grandes, como os urubus, que acabam encostando em dois fios ao mesmo tempo. Outro triste exemplo é o joão-de-barro (Furnarius rufus). Apesar de pequena, essa espécie adora construir ninhos no alto dos postes, aumentando as chances de esbarrar nos elementos condutores.
Em Santa Catarina o joão-de-barro virou um verdadeiro problema: entre 50 e 60% dos postes localizados na região rural apresentam ninhos. Segundo as empresas responsáveis pela distribuição de energia, cerca de 10% dos pequenos blackouts são causados por ninhos construídos muito próximos à “fase viva” do poste, como os isoladores de porcelana (na foto, é o objeto à direita do ninho). Quando chove, o ninho fica úmido e os riscos de causar um curto-circuito aumentam. Para contornar o problema, foi desenvolvido um “afastador” de ninhos. É uma peça feita de plástico ou fibra de vidro, que deve ser instalada ao lado dos elementos condutores do poste. Assim, o joão-de-barro só consegue construir seu ninho em locais que não apresentem muito risco. Em Passo Fundo (RS), a alternativa foi aumentar a capacidade isolante dos materiais.
Mas o joão-de-barro não é a única vítima das redes elétricas nas cidades. Aqui do lado da minha casa tenho mais um exemplo. Uma família de bem-te-vis (Pitangus sulphuratus) se instalou num transformador, já faz alguns anos. Há pouco tempo encontrei um deles morto no chão, estatelado ao lado do poste. Desde aquele dia estou ensaiando escrever este post.
Evitar acidentes com aves de grande porte é um desafio ainda maior. Em todo o mundo muitas espécies, inclusive algumas ameaçadas de extinção, colidem contra cabos de alta tensão ou são eletrocutadas ao pousarem sobre a rede elétrica. Segundo o ornitólogo holandês Hein Princen “junto com a caça, as colisões e as eletrocussões são as causas de origem humana que mais provocam a mortalidade dos pássaros“. Outro problema são os incêndios florestais causados por aves que, após se chocarem contra os fios, caem no chão em chamas.
O tema foi abordado durante a Convenção sobre Espécies Migratórias realizada ano passado em Bergen, na Noruega. Uma revisão de estudos mostrou que somente na região da África e Eurásia milhares de aves morrem todos os anos vítimas das redes de distribuição de energia. Cerca de 12% da população do grou-do-paraíso (Anthropoides paradiseus), ave nacional da África do Sul, morre todos os anos vítima de colisões. Aves de rapina de grande porte estão entre as espécies mais afetadas. Um estudo realizado na Espanha revelou uma situação grave: de todas as águias-imperiais (Aquila adalberti) marcadas e acompanhadas por radio-telemetria, 42% morreram vítimas de eletrocussão.
Para evitar esses acidentes a Convenção sobre Espécies Migratórias elaborou uma lista de ações mitigadoras. As mais importantes são substituir redes suspensas por cabos subterrâneos, onde isto for possível. Mas os custos são extremamente altos. Outra sugestão é utilizar dispositivos de segurança nos postes, como este que foi desenvolvido para afastar os ninhos de joão-de-barro.
Referências:
Márcio Amorim Efe, & Alexandre Filippini (2006). Nidificação de João-de-barro, Furnarius rufus (Passeriformes, Furnariidae) em estruturas de distribuição de energia elétrica em Santa Catarina Ornithologia, 1 (1), 121-124
JANSS, G., & FERRER, M. (2001). Avian electrocution mortality in relation to pole design and adjacent habitat in Spain Bird Conservation International, 11 (01) DOI: 10.1017/S0959270901001022
1 Comentário
Pessoal alguma sugestão para esse tipo de ninho na chave religadora tripolar, ele é recorrente.