Neste 8 de março, compartilho com vocês minha leitura mais recente: “The Birdman’s Wife“, romance que recria a história de uma incrível ilustradora que nasceu na Inglaterra em 1804: Elizabeth Gould.
Infelizmente Elizabeth teve uma carreira curta, pois morreu com apenas 37 anos. Ainda assim, ela foi responsável por criar centenas de pranchas que ilustraram livros importantes, em especial sobre a avifauna da Austrália. Isso tudo enquanto ela se via às voltas com a maternidade: Elizabeth teve oito filhos! Seu legado, porém, foi obliterado pelo trabalho do marido, o famoso ornitólogo John Gould.
Melissa Ashley, novelista australiana e birdwatcher de carteirinha, comenta que se interessou pela vida de Elizabeth Gould depois de ler uma biografia sobre John Gould intitulada “The Birdman” (Isabella Tree, 2004). Para escrever “The Birdman’s Wife” Melissa realizou extensa pesquisa, visitou arquivos, estudou taxidermia e entrou em contato com descendentes da família Gould.
É difícil separar o que é fato e o que é ficção ao longo do livro, que tem Elizabeth como narradora de sua própria história. Gostei muito dos relatos sobre como ela realizava seu trabalho artístico, da descrição de seu ateliê e dos materiais que ela utilizava (incluindo alguns muito peculiares, como o amarelo indiano, um pigmento que acredita-se que era obtido a partir da urina de vacas alimentadas com folhas de mangueira). Também foi muito interessante descobrir que a escolha da técnica de litografia para a publicação das pranchas teve grande influência de Edward Lear, ilustrador com quem Elizabeth dividiu seu ateliê por muitos anos.
Talvez o sobrenome Lear lhe traga à lembrança a ameaçada arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari), espécie nativa do Brasil cujo nome homenageia este artista, conhecido por ilustrar psitacídeos. Elizabeth também teve seu nome emprestado para compor o nome científico de uma ave, o diamante-de-gould (Chloebia gouldiae), um pequeno e colorido pássaro australiano que aqui no Brasil infelizmente é conhecido como ave de gaiola. Nem preciso dizer que geralmente o diamante-de-gould é associado a John Gould, embora o tributo tenha sido feito para sua esposa.
O livro dá uma ideia de como deve ter sido a vida de Elizabeth em um momento histórico de importantes descobertas feitas por naturalistas mundo afora, com novas espécies sendo descritas a todo momento. Muitas de suas belas e detalhadas pranchas foram baseadas exclusivamente em aves taxidermizadas, de espécies que ela nunca teve a oportunidade de ver vivas, o que torna seu trabalho ainda mais admirável. “A monograph of the Ramphastidae, or family of toucans (1834)” e “A monograph of the Trogonidae, or family of trogons (1835)”, obras que contemplam aves daqui da América do Sul e Central, foram ilustrados desta maneira.
Melissa dividiu o livro, que tem quase 400 páginas, em três partes: a vida em Londres, a viagem para a Austrália e o retorno à Inglaterra. Gostei mais da primeira parte, depois a leitura ficou bastante arrastada. Talvez por causa do excesso de detalhes, talvez porque desconheço a avifauna australiana e as longas descrições não prenderam muito minha atenção. Embora altamente especulativo (Elizabeth chegou a conhecer Darwin pessoalmente? Sobre o que eles realmente conversaram?), o estilo da escrita de Melissa me fez lembrar que Elizabeth não é um mero personagem de romance, ela foi uma mulher real e viveu em um mundo muito diferente do nosso.
Não é para menos que Elizabeth Gould foi escolhida para ser homenageada no Avistar Brasil 2023, evento que finalmente voltará a acontecer presencialmente entre 19 e 21 de Maio, em São Paulo. Nos vemos lá!
Sobre o livro:
The Birdman’s Wife
Autora: Melissa Ashley
Editora: Affirm Press
Ano: 2016