A única espécie de pinguim que ocorre na África (Spheniscus demersus) já era considerada vulnerável à extinção quando, em 23 de Junho de 2000, o navio Treasure afundou entre as ilhas Robben e Dassen, importantes colônias de reprodução desta ave. A embarcação, que fazia a rota do Brasil à China, provocou o despejo de 1.300 toneladas de petróleo em águas sul-africanas, ameaçando 41% de toda a população de pinguins africanos existente no mundo.
Rapidamente, o centro local de resgate de fauna começou a chamar especialistas de todo o mundo para auxiliá-los. Dyan DeNapoli, autora do livro e na época funcionária do Aquário de Boston, foi uma das várias pessoas convocadas. É assustadora a descrição que ela faz do momento em que chegou ao local e viu pela primeira vez os milhares de pinguins que haviam sido trazidos das duas ilhas, cobertos de petróleo e totalmente atônitos. Você começa a se colocar no lugar destas pessoas que, apesar de estarem na condição de especialistas, duvidavam de suas próprias capacidades para lidar com um desastre de tamanha dimensão.
Estelle estimava que precisariam de mil pessoas por dia para alimentar e tratar dos pinguins contaminados. Como havia apenas algumas centenas de especialistas em todo o mundo, o destino das aves teria de ser confiado aos habitantes de boa vontade da Cidade do Cabo. Não seriam especialistas em animais ou ornitologistas, e sim pessoas comuns com pouca ou nenhuma experiência em animais. Numa cidade preocupada com o crime generalizado, com alto índice de moradores de rua e com a aids, quão importante seria um bando de aves?
Mais do que relatar o demorado e intrincado processo de reabilitação das aves e falar sobre aspectos de sua biologia, Dyan descreve o estado emocional de todos que participaram da operação, que durou mais de três meses. Entre os cerca de 12.500 voluntários que ajudaram, alguns personagens merecem destaque. O campeão mundial de jiu-jítso Big Mike, por exemplo, foi fundamental na coordenação de tantas pessoas inexperientes, mas sem as quais a reabilitação dos pinguins teria sido impossível. Um jovem estudante de medicina foi o responsável por desenvolver um detergente mais eficaz na limpeza dos animais. Os pinguins mobilizaram brancos e negros, de todas as idades e classes sociais, que trabalharam lado a lado. E isso em um país que a pouco havia passado por um longo período de apartheid. Até mesmo pessoas sem teto se sentiram úteis e valiosas auxiliando nas mais diversas atividades.
O batalhão de voluntários e especialistas foi responsável, diariamente, por descongelar toneladas de sardinha, alimentar (muitas vezes à força) milhares de pinguins, lavar o petróleo de cada um deles, limpar as piscinas onde as aves ficavam… Muito trabalho sujo e extenuante. Atividades nem um pouco glamorosas, mas essenciais. Ninguém sabia se o esforço valeria a pena, mas a história tem final feliz: 90% daqueles pinguins sobreviveram e foram devolvidos aos seus habitats naturais. Uma taxa de sucesso muito superior as que já haviam sido obtidas em derramamentos de petróleo anteriores.
Dez anos depois do acidente com o Treasure, infelizmente, o pinguim africano entrou para a lista dos animais ameaçados de extinção, segundo a IUCN. Sua população está passando por um rápido declínio, atribuído principalmente ao esgotamento dos estoques pesqueiros na região.
O livro é muito envolvente. Um pouco depois da metade começa a ficar um pouco massante, pois a autora insiste em ficar repetindo vários detalhes do resgate. Pra quem ficou com preguiça de ler mas quer saber mais sobre uma das maiores operações de resgate de fauna já realizadas, sugiro a palestra apresentada pela escritora em Junho de 2011, para o TED Talks. Dyan resume o livro em pouco mais de 10 minutos, mas várias informações interessantes ficam de fora.
Sobre o livro:
40.00 pinguins
Autora: DENÁPOLI, Dyan
Editora: Zahar
Ano: 2011